Destaques Educação Últimas Notícias

Comitê da Caatinga promove palestra no Recife sobre plantar água e irriga-la com o sol

Projeto de uma rede de pesquisadores do Brasil (Ecolume), financiado pelo CNPq, demonstrará que é possível plantar água, comer Caatinga e irrigá-la com o sol

Nesta quinta-feira (24), o Comitê Estadual da Reserva da Caatinga promoverá uma palestra no Recife sobre fonte de energia alternativa no semiárido de Pernambuco. A entidade, que integra membros do poder público e da sociedade civil, convidou a climatologista Francis Lacerda para abordar sobre o tema. A pesquisadora lidera uma rede de pesquisadores no país (Ecolume), e, financiada pelo CNPq, vem demonstrando novas visões e aplicações a respeito. Entre os projetos em andamento no sertão desde o início do ano, ela garante ser possível plantar água, comer Caatinga e irrigá-la com o sol, através do recaatingamento e produção de alimento pelo pioneiro sistema agrovoltaico. A palestra começará a partir das 9h na sede do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), no Recife.

“O sistema agrovoltaico otimizará para fins socioeconômico e ambiental a farta radiação solar e o gerenciando da utilização do escasso recurso hídrico da região sertaneja, mas suficiente quando aplicado de modo eficaz em sintonia com a realidade ambiental do clima do semiárido”, explica Francis. O projeto para produção de alimentos (vegetal e peixes) através de um sistema de energia solar em Ibimirim, na escola Serta, é uma prova deste conceito do Ecolume e que visa estimular o consumo de plantas nativas da Caatinga, com um alto valor nutricional e já adaptadas ao clima seco desta região. E o Ecolume já visa ampliar o número de comunidades e de cidades atendidas pela rede no Sertão de PE. E para isso, além de já contar com recursos financeiros do CNPq (R$ 420 mil), tem buscado outras fontes junto ao setor público e privado.

O Instituto socioambiental Ekos Brasil, ligado ao Itaú, já pré-selecionou um projeto do Ecolume chamado “Sistema Agrovoltaico Familiar no Sertão frente às Mudanças Climáticas”. A rede de pesquisadores visa usar os recursos para a instalação de painéis fotovoltaicos voltados para a promoção da Agricultura de Baixo Carbono (ABC) em comunidades com baixo Índice de Desenvolvimento Humano, já atendidas pelo IPA.

“Os projetos e serviços socioambientais em sintonia com as mudanças climáticas precisam ser ampliados no Semiárido, região de clima seco e que já se verifica o aumento da temperatura em várias cidades”, revela Francis, que é coordenadora técnica do Laboratório de Mudanças do Clima do IPA. Ela realça que no semiárido pernambucano e do NE está o bioma Caatinga – único no mundo e com a maior das biodiversidades e com a maior população vivendo dentro dele em comparação a outros biomas. Uma agricultura eficiente e sustentável, portanto, é vital para preservação da população, fauna e flora, dependendo de ações dentro do novo paradigma do clima. Assim, Francis reforça a necessidade da aplicação prática do conceito da Ecolume. “As comunidades precisam aprender a plantar água, “comer Caatinga” e irrigá-la com o sol”, pontua.

Ela explica que plantar água é uma metáfora onde mostra a manutenção do ciclo hidrológico em áreas florestais. A planta mantêm a umidade do solo e libera para atmosfera, contribuindo para regular o microclima do local. Assim, para plantar água, deve-se fazer recaantigar (replantar) as plantas nativas ou adaptadas ao clima do semiárido. E replantando as que podem ser consumidas pelas pessoas, é possível “comer Caatinga”. O umbu e tipos de sorgo são algumas dessas vegetações, estudadas pelas unidades do IPA em Ibimirim e em Araripina respectivamente. “O pão de farinha de sorgo, por exemplo, é vendido em padarias do Recife, sendo uma alternativa para quem não pode comer glúten”, diz Francis.

As mudanças climáticas não só trazem vulnerabilidades. Elas também geram oportunidades para o sertanejo e à Caatinga, desde que o ser humano desperte para sua preservação como indutora de prosperidade social e ambiental integrada. Para isso, é preciso que sejam adaptadas a agricultura familiar focada em boas praticas de um baixo carbono. “Se o semiárido convive historicamente com pouca chuva, solo seco e com altas temperaturas, que aumentarão, é indispensável partir desse cenário, reconhecendo o novo paradigma. E isso é possível quando se transforma a abundante radiação solar do semiárido, sendo ela vital para “irrigação” das plantas, através da sua transformação em energia elétrica através do painel fotovoltaico para captar e bombear água”, diz Francis. Por estar no clima semiárido, a pesquisadora frisa o necessário uso eficiente e eficaz da pouca água da região, fazendo o uso inteligente de cada gota.

O conceito da Ecolume potencializa a implantação de uma agricultura familiar sustentável de baixo carbono no Sertão, aquela capaz de reduzir a emissão de gases de efeito estufa através da produção de energia renovável. Também suga, através das plantas, o CO² já disperso na atmosfera. E ainda oportuniza a produção de alimentos provenientes do plantio de culturas de plantas nativas e adaptadas ao clima local. E isso potencializa outros benefícios socioambientais, como uma melhor qualidade do ciclo hidrológico e a reeducação relativa ao uso da água.

“Assim, o IPA vem contribuindo para a transição de uma agricultura mais limpa e saudável para os produtores e consumidores. E o Ecolume está atualíssimo ao incentivar uma produção que valoriza o homem e o seu modo de vida e de produção dentro do bioma, aproveitando o sol como produtor de energia e não de seca e de miséria”, avalia a doutora em Sociologia Rural, Eliane Noya, do Departamento de Pesquisa do IPA. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) também está nesta missão. O pesquisador Alexandre Barros, do Centro Nacional de Solos, é um dos membros da Ecolume e está bastante entusiasmado.

Para Geraldo Majella, coordenador do Departamento de Pesquisa do IPA, as atividades de recomposição das plantas nativas e adaptadas à Caatinga e de produção de energia renovável propostas pelo Ecolume têm relação intrínseca com os programas centrais definidos pela ONU para a Agricultura de Baixo Carbono (ABC). O Ecolume inclusive tem um outro projeto neste sentido em análise pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). O resultado final deve sair nas próximas semanas. “Dos setes programas centrais para a ABC, considero as mudanças do clima a base de todos os outros prioritários”, diz Majella. Ele avalia o conceito do Ecolume como também pedagógico para a capacitação profissional dos extensionistas e agricultores sobre a mudança climática, sobretudo para compreensão deles sobre a adoção de ações de mitigação e adaptação de curto prazo das suas atividades.

Além do IPA e da Embrapa, a rede Ecolume é formada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Instituto Nacional do Semiárido (Insa), Instituto Federal do Sertão, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Sustentabilidade e Serviço de Tecnologia Alternativa (Serta).

Deixe um comentário