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Paço do Frevo inaugura a exposição “Patrimônios Periféricos”

O Paço do Frevo lançou a exposição do “Patrimônios Periféricos”, que conta com a curadoria coletiva de 20 jovens de periferias da Região Metropolitana do Recife. A mostra é fruto de diversas ações do projeto “Paço Criativo”, em desdobramento das oficinas de Mobiliário e Expografia, Criação e Produção Audiovisual e Iluminação Cênica e de Exposições, que formaram jovens para atuar na montagem do trabalho. O “Paço Criativo” já qualificou mais de 500 jovens e é realizado desde o início de 2021 pelo Instituto de Desenvolvimento e Gestão (IDG), responsável pelo museu, no Recife (PE), em parceria com a Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI).

O conceito da exposição “Patrimônios Periféricos” foi concebido durante a oficina de Curadoria, que integrou as atividades nas áreas de cultura e empreendedorismo ofertadas pelo projeto. Coordenada pelo designer Arthur Braga, a oficina reuniu 20 jovens que residem em comunidades do Grande Recife para desenvolver em conjunto a curadoria da mostra, composta por nove obras, também assinadas coletivamente pelo grupo. O resultado busca proporcionar a vivência das periferias para os visitantes e traz para o museu a narrativa que as comunidades querem contar sobre elas mesmas. Logo, o protagonismo desses jovens propõe um diálogo direto com o público e convida as periferias a ocupar esse espaço também como espectadora.

“Depois de quase um ano do início do Paço Criativo, um programa que ajuda na formação de jovens de 16 a 29 anos das periferias da Grande Recife, vemos vários resultados concretos. A exposição ‘Patrimônios Periféricos’ é mais um deles e apresenta uma temática importante que é a ‘voz das comunidades’, por meio de obras que apresentam a realidade retratada por quem realmente as vive. Na OEI apoiamos a geração de oportunidades e valorizamos o patrimônio histórico e local, preservando as identidades locais e o conhecimento popular”, comentou Raphael Callou, diretor e chefe de representação da OEI no Brasil.

Oriundo das ruas do Recife e criado a partir da soma de diversas expressões culturais periféricas, o Frevo compartilha da mesma diversidade apresentada pelos jovens na exposição “Patrimônios Periféricos”. “Temos trabalhado com parcerias para o Paço de Frevo que direcionam a curadoria e as atividades no sentido de trazer mais diversidade, vozes e narrativas para o espaço museal, além de reforçar a conexão do Frevo com a Cidade do Recife”, observa Maria Garibaldi, diretora executiva do Paço do Frevo.

Os jovens curadores e coautores das obras são Aldeny Cavalcanti, Dodô Trajano, Emerson Gomes da silva, Jefferson da Silva Vitorino, Júlia Abage, Lalesca Alves, Luiz Phillipe Seixas Ramos de Barros, Maria Clara de Lima Santos, Maria Eduarda Gomes de Oliveira, Maria Gabriela Lima de Carvalho, Matheus Vinicius Das Neves, Maurício dos Santos, Micaela Almeida, MISS, Sales Pas Mesmo, Suennya Seixas, Súzan Araújo, Tuca Duarte, Vanessa Maria Rodrigues, Vênus Matos, Virginia Matos, Wictor OUTRO, Yana Ribeiro Teixeira, Zarthur Felipe da Silva.

OBRAS – As narrativas desses jovens estão representadas através de instalações e videoartes, como “Corpes Dissidentes”, que denuncia as implicações sociais envolvidas no cotidiano dos corpos que divergem dos padrões estéticos hegemônicos e estão presentes nas periferias. A obra reflete sobre como os corpos atravessados pela racialidade, dissidência sexual e deficiências, por exemplo, relacionam-se com o esse espaço físico e têm suas posições sociais condicionadas não só pela geografia em que estão inseridos, mas também pela forma como são retratados, recebidos e abordados pela sociedade e pelo poder público. Dentro desse contexto, o ambiente destaca a potência desses dissidentes como criadores, pensadores e transformadores sociais de uma realidade mais abrangente.

A mostra conta com mais um trabalho audiovisual chamado “Gaiolas”, escancarando o racismo estrutural, que promove o cerceamento das liberdades individuais nas periferias. Essa realidade é exposta através de vídeos em que poesias são declamadas provocando reflexões sobre a falta de condições urbanas para que as juventudes empobrecidas exerçam o seu direito de ir e vir, além da escassez de políticas que garantam o uso seguro da cidade por essas populações. O cenário de negligência induz a um aprisionamento desses jovens em seus territórios também pelo receio de opressões, como a repressão policial e o genocídio da juventude negra. Porém, na contramão da ideia de cárcere, a obra tem como peça central a gaiola aberta, que aponta para as alternativas que a própria periferia cria para sobreviver dentro e fora desse ambiente, se expressar e contornar o abandono do poder público.

Os processos de exclusão das comunidades ainda são tocados na obra interativa “Não Está no Mapa”, que provoca uma reflexão sobre os locais que não são encontrados pelos sistemas de geolocalização, revelando lugares esquecidos pelo poder público e de difícil acesso. Esse ambiente será composto por um mapa indefinido, em que os visitantes poderão marcar lugares que conhecem e não são identificados por GPS, formando um grande mapa afetivo ao final da exposição. Outro trabalho que contará com a colaboração do público será o “Pixe Aqui”, que traz o universo do pixo, tão marcante nas ruas da periferia, para dentro do museu, convidando todos a rabiscar a parede do ambiente com giz. Como a prática do pixo se baseia na conquista do espaço pelos pichadores, os curadores pensaram neste ambiente como uma forma de dividir a conquista do Paço do Frevo com os visitantes.

De origem periférica e parte da cultura das ruas, o Frevo naturalmente também atravessa as obras. O seu papel catártico e socializador dentro desse ambiente fica evidente em obras como “Narrativas Periféricas”, onde um mural de fotos homenageia lideranças comunitárias, incluindo mestres do ritmo. A dança e as orquestras são retratadas em alguns trabalhos da instalação “Galeria Periférica”, que exibe peças de artistas oriundos de diferentes periferias de Pernambuco. Nessa última, serão disponibilizados os contatos dos criadores das artes para que os visitantes possam comprar os trabalhos e levá-los para casa após o fim da exposição.

A presença do Frevo no dia a dia das comunidades está inserida no “Cenário Louco”, que apresenta uma paisagem marcada pelas afetividades e memórias simbólicas das comunidades. Esse trecho da exposição traz um mosaico de referências estéticas que vão do Carnaval ao cotidiano, ilustrando a vivacidade das periferias, onde seus moradores compartilham as ruas com varais de roupa, letreiramento vernacular, dentre outros objetos. Um dos elementos que sugerem esse vigor são as brincadeiras de rua, como a pipa, o peão e a bola de gude, que estão representadas na obra para apontar a rua como o espaço onde as crianças da periferia crescem e permanecem também na fase adulta.

O universo infantil ainda encontra brecha na obra “Altar dos Erês”, em que a infância divide o mesmo espaço sagrado do sincretismo religioso presente nos lares da periferia. Esse ambiente conta com uma penteadeira ornamentada por várias imagens religiosas e de crianças, dentro outros elementos como um jarro da planta Espada de São Jorge, buscando resgatar a memória das casas das avós benzedeiras. O trabalho lembra desses espaços como um lugar de cuidado e de saberes populares que são transmitidos pela oralidade dos mais velhos para os mais novos, reforçando a conexão da periferia com a sua ancestralidade.

Para completar o conjunto de obras que resgatam a memória afetiva, “Dicumê” apresenta a dinâmica gastronômica que faz parte de algumas comunidades. Desde o prato feito do cotidiano até as comidas que caracterizam os dias de festa nos Terreiros, a instalação mostra como as iguarias revelam o contexto em que são produzidas. Para ilustrar a abundância, por exemplo, a obra aborda frutos da agroecologia e comunidades que vivem de soberania alimentar, já a escassez encontra materialidade nos alimentos feitos com ossos de boi, por exemplo.

“Aprender a curadoria vivenciando esse processo foi algo que funcionou muito bem e acho que é muito importante esse movimento de abrir um espaço cultural, como o Paço do Frevo, para uma exposição sobre patrimônios periféricos. A gente está criando obras que trazem elementos dos próprios curadores, por isso, apesar de ser uma exposição única, também tem as particularidades de cada um. Além disso, cada visitante vai ser tocado por elementos específicos e dar sua própria conotação para essas obras. Acho que o Frevo tem um pouco disso também, porque, às vezes, a gente fala dele com um certo distanciamento por ele já estar nesse lugar de patrimônio, mas ele vem dessa construção de populares que só queriam se expressar e hoje tem esse lugar de unidade, mas não é uma construção unitária, porque tiveram várias mentes pensando e várias experiências da periferia transbordando no Frevo também”, observa o artista visual Dodô Trajano, que participou da oficina de Curadoria e está entre os jovens que criaram a exposição.

ENTRADA – A abertura da exposição “Patrimônios Periféricos” contará, ainda, com a apresentação das DJs Karla Gnom e PunnyBR e da Orquestra do Maestro Carlos, que se apresentarão na calçada do Paço do Frevo, em frente à Praça do Arsenal da Marinha, a partir das 17h. A mostra permanecerá em cartaz até o primeiro semestre de 2022 e poderá ser conferida no horário de funcionamento normal do Paço do Frevo que, neste domingo (28), abre entre às 11h e 17h. O ingresso para a exposição estará incluso no valor da entrada ao museu, sendo R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

NOVO HORÁRIO – A partir do dia 30 de novembro, o Paço do Frevo amplia o seu horário de funcionamento, abrindo de terça a sexta-feira, das 10h às 17h, e sábado e domingo, de 11h às 18h. A ampliação do horário dá continuidade à retomada das atividades do museu, que no mês de novembro passou a ter atividades em formato híbrido – on-line e presencial, com público reduzido para garantir os cuidados necessários ao combate da pandemia do Covid-19.

O “Paço Criativo” foi concebido para unir o conceito do “Frevo Atitude” — mote do Paço que se baseia em uma identidade ativista e propositiva pela diversidade de conteúdos e públicos —, com o projeto da OEI, “Jovem Hipercriativo”, voltado para formação e capacitação em economia criativa com foco em jovens de idades entre 16 e 29 anos, residentes em áreas vulneráveis e ou localidades de alto índice de desemprego. Além dos cursos formativos, o projeto contemplou ações de acesso, fruição e difusão de iniciativas culturais e educacionais, estimulando a circulação de conhecimentos e habilidades.

VISITAÇÃO

A partir de 30 de novembro: terças a sextas-feiras, das 10h às 17h; sábados e domingos, das 11h às 18h
O ingresso para a exposição estará incluso no valor da entrada para o Paço do Frevo, que custa R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).

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