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Serviço psicossocial promove histórias de superação

Por cerca de seis anos a rotina de M.M., 32 anos, resumia-se a encontros assíduos regados ao consumo de álcool.  Na companhia de um grupo de amigos, consumia de oito a 11 litros de bebida diariamente. Ele lembra da embriaguez contínua que ocorria até cinco vez por dia, com intervalos para pequenas sonecas.

Durante esse período aconteceram algumas situações desagradáveis: a capacidade cognitiva ficou comprometida, os vínculos familiares enfraqueceram, o convívio social se restringiu ao seu grupo e sete dos 11 amigos morreram por complicações causadas pelo álcool.

Foi então que, no ano de 2012, por iniciativa da mãe, M.M. procurou o serviço do Centro de Atenção Psicossocial – Caps AD III Capibaribe, em Limoeiro. Lá teve o acolhimento necessário para dar início à recuperação da dependência e tentar voltar a reinserir-se na sociedade.

Esse tipo de caso é dos mais típicos. Com os laços familiares fragilizados, às vezes o dependente químico procura ajuda quando já está num estágio de descrença, devido “a tentativas frustradas. Ou vai só porque os pais, a esposa ou outro familiar insistiu. Então, dentro do projeto, tem o grupo de família feito pelas psicólogas, terapeutas ocupacionais e enfermeiras que trabalham sobre como lidar com a dependência”, explica Talita de Pádua, coordenadora do Caps AD III.

Para ela a dependência não é um problema apenas do usuário, “outras coisas geram esse sofrimento. Então, por sofrer algo que não consegue falar, ou para ser aceito num grupo, muitos acabam buscando alívio em alguma droga”. O fato do álcool ser aceito socialmente, aumenta o grau de dificuldade em reconhecer a necessidade do tratamento. As drogas em geral provocam problemas de saúde e orgânico e destroem laços afetivos. Quando resolvem procurar o serviço, muitos não têm ninguém de referência para o apoiar. “Se não tem família de sangue, chamamos de família qualquer pessoa de laço afetivo que o apóie”, esclarece Talita. Atualmente M.M. frequenta o Caps dois dias por semana. Ele considera que houve um avanço positivo na recuperação e só bebe esporadicamente, chegando a passar até um mês sem fazer uso de álcool. Além disso, consegue desenvolver atividades informais para adquirir renda.

O serviço

O Caps é voltado para usuários de uso abusivo de álcool, crack e outras drogas. Sua pactuação (ou convênio) foi formalizada entre a Secretaria Municipal de Saúde e o Estado para oferecer serviço a Limoeiro e mais sete municípios, além de outros que não dispõem de Caps AD e necessitam temporariamente do serviço.

Atualmente o Caps conta com mais 80 usuários assíduos, mas o número de prontuários abertos de pessoas que usufruem dos serviços ultrapassa 500. “A estratégia é a redução de danos. No entanto, o usuário precisa querer aderir ao tratamento. Não basta a família querer, ele tem que perceber que é um dependente e que precisa de cuidados”, pontua a coordenadora.

Rede e parcerias

Para ser aceito como usuário do Caps, não há necessidade de encaminhamento. A pessoa pode passar pela Atenção Básica, ou ir direto ao serviço e é acolhido. Dentro da proposta de cuidado existe uma rede de apoio chamada Raps (Rede de Atenção Psicossocial) que abrange a Atenção Básica, urgência e emergência, Samu e Unidade de Acolhimento (moradia transitória para usuários em situação de vulnerabilidade que se encontre em tratamento no Caps).

O serviço tem ainda a equipe de matriciamento que, junto aos Agentes Comunitários de Saúde, enfermeiros e odontólogos, faz visitas domiciliares a fim de sensibilizar usuários de álcool e outras drogas a iniciar o tratamento ou retornar aos cuidados do Caps. “Vamos sensibilizando, articulando com a equipe de saúde, para saber se a pessoa tem acompanhamento do Cras, se é baixa renda, se precisa do Creas, se está sendo negligenciado”. A assistência social e a educação entram nas articulações em rede para sensibilizar usuários.

Projeto e grupos

Outro empecilho ao tratamento é o fato de as famílias não saberem como lidar com a dependência. Nesse caso, a equipe do Caps forma grupos com as famílias para troca de experiências. Também é trabalhado com os usuários a prevenção à recaída, cidadania, projeto de vida, terapia ocupacional, educação e saúde. E são feitos atendimentos individuais, através dos técnicos de referência de nível superior, onde é construído o Projeto Terapêutico Singular (PTS). “Para os que precisam de cuidados intensivos, podemos sugerir acolhimento noturno 24h por até 14 noites”, reforça Talita.

Autonomia

Como a estadia no Caps é passageira, a equipe proporciona várias ocupações e orientação para que os dependentes químicos continuem a exercer a profissão ou desenvolvam tarefas de acordo com as próprias habilidades. Para isso são oferecidas as oficinas de percussão e de artesanato. Os usuários têm também indicação de cursos profissionalizantes, numa articulação entre o Caps e o Instituto Pe. Luís Cecchin. De acordo com a coordenadora, “os que têm habilidade e interesse, têm autonomia para isso e ficam responsáveis por frequentar as aulas”. É uma forma de se superar. Talita contou ainda que, quando “alguns usuários estão bem organizados e precisam ter alta, resistem; principalmente os de álcool, porque têm história de perdas de vínculos de longa data”. Mas nada impede um novo recomeço. S.V.

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