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Rebeca, a primeira mulher no comando da guarda de Paudalho

Rebeca Correia tinha 18 anos quando lhe disseram que, por ser mulher, ela não passava da metade de um homem. Por muito tempo, acreditou na frase. E esforçou-se para se tornar “inteira”. A ponto de se masculinizar. Isso aconteceu em 2005, quando entrou, por concurso público, na Guarda Municipal de Paudalho. Era a única mulher entre a turma composta por 50 pessoas. Sofreu assédio sexual, vivenciou machismo na família e na tropa, bateu de frente com superiores abusivos. Rebeca não calculou, mas sua trajetória difícil terminou sofrendo uma reviravolta.
Há dois anos, ela tornou-se a primeira mulher a comandar a Guarda Municipal de Paudalho. Além do município da Mata Norte, somente Jaboatão dos Guararapes tem uma mulher no comando da instituição em Pernambuco. Rebeca está à frente de uma equipe formada por maioria de homens. São apenas três mulheres, incluindo ela. A participação em movimentos da categoria tornaram Rebeca uma pessoa de representatividade na instituição. Ela é ex-presidente da Associação de Guardas de Paudalho, é membro do Movimento de Guardas de Pernambuco e representante do estado no Conselho Nacional de Guardas, além de membro do conselho de ética.
Quando decidiu entrar para a Guarda Municipal, Rebeca ouviu do pai, um policial rodoviário federal aposentado, que ele não pagaria a inscrição do concurso para a filha ocupar um cargo masculino. A mãe, lembra ela, dizia preferir a filha como funcionária de serviços gerais. Em uma homenagem feita no último dia da mulher, em 8 de março, o pai disse à filha comandante, em público: “Quero ser você quando crescer”. Novos tempos na vida da comandante.
Rebeca somente começou a mudar de ideia sobre ser metade de um homem quando se capacitou. Fez gestão em administração pública e cursa 8° período de direito. Entendeu que a sociedade defende aquele que a protege. “Não há como fazer prevenção de violência e ter vínculo com a sociedade sendo grosseira com ela”, pontua. Para não ser rejeitada pelos colegas de trabalho, muitas vezes foi violenta nas abordagens contra suspeitos. “Cheguei a bater. Alguns colegas passaram a dizer que eu valia por dois homens”, lembra. A chegada do filho, hoje com nove anos, também trouxe reflexões sobre sua conduta abusiva. “Não queria que tratassem meu filho como eu tratava os outros na rua.”
Em Paudalho, a violência contra a mulher é uma das ocorrências mais percebidas pela Guarda Municipal. Inspirada em um trabalho desenvolvido em Jaboatão, a comandante apresentou à prefeitura o projeto Brigada Maria da Penha. A ideia é prestar atendimento à mulher vítima, levá-la à delegacia – a mais próxima fica em Nazaré da Mata – e depois seguir acompanhando a situação da mulher com rondas próximas à casa da vítima, por exemplo. A ideia também seria disponibilizar um número direto com a guarda para situações de emergência.
Outra novidade na gestão de Rebeca é o 1º Encontro de Guarda Feminina de Pernambuco, que acontecerá pela primeira vez em Paudalho, em 10 de agosto. São 150 mulheres inscritas, sendo uma dela trans, para discutir políticas públicas voltadas à mulher na área de segurança. Homens são proibidos de participar. “A ideia é deixar as mulheres à vontade para darem seus depoimentos. Pelo Whats’App, tenho recebido relatos de abuso de vários locais, inclusive de um estupro coletivo.” No dia da entrevista, Rebeca vestiu sua farda de gala para posar para a foto. A roupa foi encomendada por ela pouco antes da posse. Colocou também um salto e pouca maquiagem. No final, fez questão de lembrar: “Estou comandante. Eu sou guarda.”
*Matéria publicada no Diário de Pernambuco
*Foto: Marlon Diego/Esp DP

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